No espaço, ninguém pode escutar um Droide apelando por direitos
Esses não são os droides que você estava procurando, mas eles te encontraram e agora querem conversar sobre direitos trabalhistas!
Olá e feliz ano novo! Estamos na primeira semana de 2025 e, como de costume, janeiro não é um mês marcado por grandes estreias e novidades. Na verdade, este período costuma servir como um "terreno de despejo" (tradução doida de dumping ground, não achei termo melhor) para obras que estúdios, produtoras e editoras consideram de menor apelo popular — especialmente no mercado cultural americano.
No Brasil, muitos dos filmes que concorrem a premiações gringas acabam estreando por aqui no final de janeiro ou começo de fevereiro. Este ano, no entanto, com a presença de diversas produções independentes (ou menos dependentes dos três grandes estúdios), alguns desses filmes só chegarão após a temporada de premiações.
Considerando esse contexto — e ignorando o fato de que mudei de ideia sobre começar o ano discutindo matadores de aluguel (oops!) — a profissão imaginária que abre 2025 teve seu mais recente representante na série Skeleton Crew, do Disney+, uma das poucas que cruzou interminada de 2024 para 2025. Os droides, como são conhecidos os robôs em Star Wars, não são nenhuma novidade. No universo fantástico/sci-fi da saga, eles existem há milhares de anos, com poucas atualizações significativas — como os iPhones nos últimos 7 anos, né?
Em Skeleton Crew, o droide SM-33 (dublado pelo ator inglês Nick Frost) é uma unidade pirata que, ao contrário da lógica anárquica associada aos piratas, segue uma programação estritamente definida por seu antigo capitão. Visualmente, o SM-33 é uma figura mecânica cheia de falhas e problemas estruturais, habitada por pequenas criaturas que circulam por suas partes, o que contribui para seu aspecto decrépito e intimidador, ideal para uma produção infantil que evoca Goonies.
Fora isso, ele é bastante semelhante a outros droides já conhecidos de Star Wars, cumprindo uma função profissional como todos eles. Nunca ficou totalmente claro no universo da saga (considerando aqui o cânone principal dos filmes e séries, e não tanto os livros e quadrinhos do universo expandido) o quão autônomos ou independentes são os droides. Mas uma coisa é certa: todos eles têm um propósito bem definido. Alguns fazem manutenção de naves, como o famoso R2-D2; outros atuam em diplomacia, como o igualmente notório C-3PO, que é capaz de falar mais de seis milhões de idiomas (num universo onde quase todo mundo se comunica em "Básico").
Embora nem todos os droides vocalizem em Básico, todos parecem entendê-lo e utilizam a comunicação para trabalhar. Mesmo quando saem de suas funções básicas, como o K-2SO em Rogue One, eles mantêm certa coerência em seu "campo de atuação" — no caso de K-2SO, de assassino imperial a segurança rebelde. Até mesmo os mais fofos (toyetic!) e aparentemente inofensivos, como o BB-8 da nova trilogia, realizam tarefas essenciais como interceptação e infiltração, atuando como espiões nas eternas Guerras nas Estrelas.
Uma possível exceção é o droide B2EMO, apresentado pela primeira vez em Andor. Ele parece funcionar mais como um "cão de companhia", o que pode não ser exatamente uma profissão, mas ainda é uma função que ele desempenha com maestria na sala da Fiona Shaw.
Muito poucos droides escolhem o que fazem e menos ainda decidem mudar completamente de "carreira", o que sempre me fez pensar que eles não são apenas trabalhadores, mas escravos de uma lógica de programação perversa cuja origem permanece obscura. Sabemos que a fabricação e distribuição desses droides estão nas mãos de empresas (algumas mencionadas esparsamente em séries animadas), mas nunca ficou claro quanta inteligência ou autonomia é programada "de fábrica". Será que eles são sempre comissionados pelo Estado (pela República ou pelo Império), como os clones encomendados no planeta Kamino? Pessoas comuns podem encomendar os próprios droides?
O que sabemos com certeza é que esses droides são personagens plenamente realizados, individualizados por nomes próprios, capazes de tomar decisões complexas, mudar de afiliações políticas e até se sacrificar por amigos ou por causas ideológicas. Eles não deveriam ter… hmmm… Direitos Básicos? Pelo menos a liberdade de formar um sindicato ou ter um representante no Senado Republicano? Não sei, mas se Star Wars pretende explorar novos horizontes ao invés de repetir as mesmas histórias de Jedis contra Siths, talvez seja hora de prestar mais atenção nessa obscura categoria profissional!
Skeleton Crew está disponível no Disney+.
Trabalho de Casa
Ao invés de encerrar a newsletter com um teaser sobre a próxima edição, decidi linkar textos que li recentemente sobre cultura e sociedade. Quem sabe, assim, a conversa não termine por aqui:
No Medium, o especialista em jogos Felipe Pepe discute como a experiência latino-americana informa nossa relação com video-games e como ela é distinta dos jogadores que cresceram em países como EUA e Japão.
No Hollywood Reporter, Daniel Fienberg comenta a nova tendência das comédias "tristes", analisando séries como Shrinking (que não gosto, mas entendo o sucesso), A Man On The Inside (do criador de The Good Place) e Somebody Somewhere, de Bridget Everett.
Em um blog sobre Final Fantasy VIII, o bibliotecário Phil Salvador comenta como um diálogo no jogo reflete a precarização das bibliotecas no mundo real.
No NYT, Natasha Degen explica como colaborações criativas, como a de Barbie e Wicked, transformam campanhas promocionais em fenômenos culturais inescapáveis.
Na The Atlantic, Ian Bogost compara o hábito de ignorar estranhos nas cidades (refletido por diversos escritores) com nossa interação com produtores culturais na Internet.
Até a próxima quinzena!