O Esconderijo da perversidade

O Esconderijo da Perversidade
Por Lucas D. M. dos Santos
Em "A Rapública", Platão registrou a metáfora do Anel de Giges. A história toda possui vários detalhes, mas em resumo, Giges era um pastor a serviço do rei, até o dia em que encontrou um anel que o tornava invisível e imperceptível. Não sei o que você faria com esses poderes, mas Giges deu um jeito de convencer a rainha a trair seu marido e conspirar para a sua morte, tornando-se assim rei em seu lugar.
Desde que a história foi contada ela virou tema de discussões sobre a natureza humana. Glaucon, irmão de Platão e narrador da história, defendia que qualquer pessoa ao usar o anel praticaria perversidades, pois apenas a coerção social seria capaz de tornar o homem justo. Alguns séculos depois Cícero discordaria, em De Officiis (“Sobre os Deveres”), ele expõe o entendimento de que um homem justo e sábio permaneceria assim mesmo ao usar o anel.
Essa discussão seguiu pelos próximos séculos e milênios, envolveu homens como Thomas Hobbes e John Locke, entretanto, permanece sem solução. Mesmo assim, tanto tempo depois, o Anel de Giges ainda serve como uma metáfora para entender qual a nossa moral, isto é, aquilo que faríamos se não estivéssemos sujeitos à lei e pressões sociais.
Apenas como um exercício imaginário, claro, já que não há um anel do tipo no mundo real (até onde eu sei) . Ainda assim a perversidade costuma encontrar outros artifícios para se ocultar. Entre eles, ostentar princípios e se vestir com um verniz de integridade, para então cobrar ativamente o mesmo dos demais. O moralismo. Isto é, a tentativa de impor determinados princípios morais a toda a sociedade. Que tal como o Anel de Giges, levou um perverso ao poder no Brasil recente.
Se o proselitismo moral sempre foi presente na política brasileira, ele ganhou novos contornos com a operação Lava-Jato. Amparada no ideal moralista de “limpar a política”, juíz e procuradora cometeram uma série de abusos na condução das investigações e processos, evidenciados nas conversas divulgadas pelo site The Intercept entre procuradores e o juiz responsável pela operação, que mais tarde se tornaria ministro no governo mais moralista da Nova República.
Governo este que, segundo a Transparência Internacional, realizou o "desmantelamento contínuo das estruturas criadas, ao longo dos últimos anos, para combater a corrupção". Sem contar o saldo de centenas de milhares de mortes evitáveis durante a pandemia de COVID19, a extensa lista de casos de corrupção e o completo apagão de dados da transparência do Estado.
Ao que tudo indica, este governo está prestes a acabar, porém, governante nenhum surge no vácuo, este por acaso surgiu em um Brasil que é ao mesmo tempo o país que mais mata pessoas transgênero no mundo, normalmente em nome de uma suposta moral conservadora, dentre eles a suposta defesa da vida, enquanto também é o país que mais consome pornografia trans
Pessoas são contraditórias, jamais viveremos à altura de nossos ideais, tanto os internos quanto os que exibimos por aí e não devemos cobrar tamanho virtude nem de nós mesmos, nem dos demais. Isso, porém, não nos impede de examinar quais perversidades se escondem por trás de cada moralismo e sinalização virtuosa que praticamos diariamente, tanto individualmente, quanto como sociedade.
Afinal todos somos parte do país que elegeu Bolsonaro, mas que felizmente agora o mandou para casa.
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