Episódio XIII - Pontos de inflexão (ou: destruction leads to a very rough road)
Primeiramente, quero convidar quem estiver lendo este texto a dar play nesta música, um clássico dos anos zero e o meu videoclipe favorito da vida.
Então: a expressão do título vem se tornando mais comum graças à circulação dos estudos e notícias das mudanças climáticas. Na gringa eles chamam de “tipping points”, que em português se traduz como “Pontos de inflexão”. A galera da divulgação científica que eu sigo usa bastante.
“Inflexão” é uma palavra que eu vi raríssimas vezes na vida, em artigos científicos e publicações especializadas na época da faculdade. Aparecia uma vez ou outra em textos de economia (ou com pegada de texto de economia), sempre fazendo alusão a pontos hipotéticos num gráfico.
Isso está mudando, e a palavra já faz parte ao menos da linguagem jornalística mais comum. Com o perdão da piada, parece ser mais uma mudança que veio para ficar.
Eu pessoalmente prefiro “Ponto de não-retorno”. Reconheço que é tradução bem pior, mas eu gosto mais dessa forma. Na minha cabeça, acho que entrega mais facilmente a idéia daqueles pontos que, uma vez cruzados, nos levam a uma realidade da qual a gente não volta mais. O clássico “nada será como antes”.
Tem também uma outra expressão que eu uso bastante, “ir pro vinagre”. Mas que, verdade seja dita, não faz a devida justiça. Não ao menos pra mim.
Primeiro porque me sugere mudanças ruins, ou mudanças como coisas necessariamente ruins. E mudanças, por si só, são apenas mudanças. Fora de contexto, no macro, não são nem boas e nem ruins. É apenas o mundo seguindo seu curso.
Segundo porque ela é metida a engraçadinha, o que pode não ser adequada para situações onde, dada a contextualização, as coisas não são engraçadas.
Se a campanha do seu time no campeonato foi pro vinagre, ok. É como aquele rolê 5 de copas do WS, em que tem três taças caídas de duas em pé. Dia continua, vida que segue e ano que vem a gente tenta de novo.
Por outro lado, se o seu país está com um golpe de estado em curso, ou em guerra, acho que não convém. Nesse aspecto, convém usar uma expressão mais adequada, para quando não dá pra fazer piada besta com coisa séria.
Nada contra piadas e deus me livre ficar policiando a comunicação alheia. Mas uma das coisas que o budismo me ensinou é que palavras importam e uma apreensão correta da realidade idem, porque senão ela te engana e te fode ainda mais.
Idealmente a gente dá o nome certo às coisas e tenta vê-las do jeito correto, como elas são - especialmente em épocas de excesso de informação, desinformação e duplipensar. A linguagem parece que foi pro vinagre junto com o consenso de realidade. Palavras não significam mais nada porque tudo vai depender, no fim as contas, de qual ponto do espectro político ou o quão imerso em desinformação você está.
São vários pontos de inflexão.

O ano de 2025 já caminha para a conclusão do seu segundo mês. Falta algo em torno de trinta dias para o ano novo astrológico (que é o que importa), e nesse curto espaço de tempo, tivemos um começo de governo Trump no mínimo muito veloz na implantação de suas agendas. Teremos um provável final da guerra da Ucrânia e um provavel fim da aliança transatlântica entre os EUA e a Europa. Já temos algumas análises do primeiro mês do governo Trump II e mais acidentes aéreos. E é claro, temperaturas recordes.
Nesse meio tempo, na mesma semana, a China lançou o DeepSeek, sua IA melhor e mais barata que o chat GPT, e ainda anunciou um novo recorde de tempo de funcionamento de seu reator de fusão nuclear - uma tecnologia crucial de geração de energia limpa e enfrentamento da crise climática.
Serinho, fiquei muito perplexo com a notícia e achei mais um caso auspicioso de astrologia literal, com o Sol em Aquário, sob o domínio de Saturno em um signo humano cujo mito é sobre um rapaz que serve a bebida que alimenta a imortalidade dos deuses.
O ano de 2024-25 foi no mínimo intenso, mas se fosse um filme, seria daqueles em que na última meia acontece tudo que não aconteceu na primeira uma hora e meia de filme.
Ainda bem que eu não levantei nenhum mapa pro ISA 25-26, porque se o tivesse feito antes, teria que jogar tudo fora e recomeçar do zero.
Por falar em filme, esse vídeo acima foi uma ótima descoberta recente. Explica e contextualiza o que está acontecendo hoje. E o que está acontecendo é mais um ponto de inflexão na história.
E a porra do sol artificial.
Pra onde vamos? O que vai ser de nós? O mundo vai acabar? Isso é bom ou ruim? Os especialistas em geopolítica e economia tem dificuldade em responder, e os oraculistas mais ainda. Porque não é fácil.
O que sabemos é que nada será como antes.

Um bolo, depois de feito, não pode ser desfeito e ter seus elementos retornados ao seu estágio anterior. Não dá pra tirar os ovos da estrutura da massa assada e reverte-lo à sua condição original, assim como os demais ingredientes. Não dá pra devolver o calor usado pra assar o bolo de volta pro forno. Mas o bolo é uma metáfora ótima da transmutação alquímica: vil metal transformado em ouro por processos artificiais controlados. Sabendo-se o método, o chumbo vira ouro e os ingredientes viram um bolo.
Infelizmente, boa parte dos processos humanos não tem uma receita. Existem processos que são como inventar um prato inteiramente novo, e nesse horizonte de descobertas, coisas podem dar errado (ou muito errado, ou muito certo), como todo experimento real em que não se sabe o resultado previamente. Faz parte do jogo.
Mas em outros vezes até tem a receita, mas é aquele tipo de receita idiota que todo mundo sabe que não dá certo. Mesmo assim, muita gente insiste em repetir a receita acreditando que ela vai funcionar. Como naqueles vídeos de TikTok de gente lavando frango na pia antes de cozinhar - normalmente é daí pra baixo.

A vida é cheia de pontos de inflexão, precedidos e sucedidos por períodos de uma realidade cuja forma parece mais ou menos estável aos nossos sentidos e à nossa razão. Quer dizer, é real a estabilidade das coisas ou é a nossa apreensão que está enviesada? Ou as duas coisas, talvez?
A solidez (muitas vezes aparente) é sustentada por um equilíbrio sutil até o momento em que ele é desfeito e nada mais se sustenta. O regular, o estável e o sólido só existem em relação ao seus opostos. A entropia tá aí e o Samsara não tem solução.
Essa newsletter, por exemplo: mudei a plataforma para escapar dos problemas da antiga. Estou me adaptando à interface e ao modo de trabalhar nela. O que antes estava perfeitamente azeitado e tunado precisa ser feito aqui do zero.
Gostei de algumas coisas, sinto falta de algumas outras. Dá um trabalho ficar procurando as ferramentas e as funções que eu já sabia fazer na outra newsletter, mas é parte do processo de aprender um rolê novo e que me possibilita fazer coisas que não dava (ou sequer imaginava que dava) pra fazer antes.
O que eu mais queria, no entando, era que a motivação pra mudar de casa (ou se pá de escrever a newsletter, se alguém lembra de quando eu comecei com ela) sequer existisse.
Mas ela existe, e cá estou eu aqui escrevendo e concatenando melhor as idéias porque eu as coloquei num suporte externo à bagunça que é a minha “tela mental” e dividindo com vocês.

Na iminência desses pontos de não retorno, o melhor a fazer é se preparar. Essa é a parte “fácil”, com ênfase nas aspas.
O difícil é juntar os pontos e entender o que está acontecendo. A eterna pergunta de um milhão de dólares que motiva oraculistas, místicos, jornalistas, economistas, filósofos, sociólogos, etc.
E é dificílimo prever o que vai ser depois de um ponto desses. Porque a gente só vê as coisas com calma e liga os pontos no raiar do dia seguinte.
E, claro, depois de tudo entendido, é passar a régua no que tem que passar a régua e se preparar espiritualmente pro que surge no horizonte.
E seguir em frente.