Episódio 7 - A esfera de Mercúrio (Ligando o Tico e o Teco)
Tem umas semanas que a newsletter do Substack mandou um texto tentando falar bem pros usuários daqui sobre as conseqüências do ultimato que a Apple Store deu no Patreon.
Resumo: ou o Patreon topa pagar 30% na Apple Store ou roda. E ao que tudo indica, ele vai ceder.
O impasse: o produtor de conteúdo que não tem nada a ver com essa negociação corre o risco de perder 30% das suas receitas pra Apple Store do dia pra noite, sem nenhuma contrapartida. No caso específico dos produtores que ganham dinheiro com o Substack, ele já dá uma mordida de 10%.
Ou o produtor de conteúdo arca com a perda das receitas ou as repassa para as assinaturas pagas, e nenhum desses cenários é bom pra quem escreve e de fato alimenta a plataforma.
Me lembra um pouco o que aconteceu com a Twitch a uns anos atrás, quando ela começou a mexer na política de pagamento para supostamente beneficiar assinantes e que teve como conseqüência perda de receita dos produtores de conteúdo - gente que tinha vontade de fazer coisas interessantes e gastava do próprio bolso pra ter a infraestrutura necessária pra gravar e editar vídeos que iam pra Twitch.
Os grandes ficaram, os médios e pequenos migraram ou morreram.
Semana se intensificou uma discussão no Substack sobre contas que ensinam outras pessoas a escrever. Digo intensificou porque, ao que parece, é uma discussão perene. Por trás de uma defesa da técnica de escrita, tinha outra conversa rolando: como gamificar a plataforma, ter mais assinaturas e potencialmente mais receita.
De certa forma, é o equivalente de texto de contas de Tiktok ou Instagram que ensinam como tirar proveito do algoritmo para ter números maiores.1
Parece que o Substack tá ganhando popularidade e se estabelecendo como formato de mídia, para a felicidade de quem é saudoso dos blogs e tumblrs da vida.. Pode ser que daqui a pouco se torne a rede social da vez, com massa crítica pra pautar comportamento, cultura e outras mídias (e por tabela chamar a atenção dos peixes grandes).
Inclusive o app de celular já parece uma mistura de leitor de textos + Twitter sem aquele ecossistema maluco cooptado por fascista. 2
Redes sociais tem um ciclo de vida e isso aqui ainda está nos estágios iniciais. Tudo parece promissor, tem cara de mato inexplorado e já tem gente querendo fazer seu nome aqui, já que outros ecossistemas já estão saturados, estabilizados ou moribundos.3 Outras pessoas querem justamente fugir da toxicidade e dos problemas de outras redes, como quem busca uma vida tranquila numa cidade pequena longe dos grandes centros urbanos.
Também tem a questão do conteúdo gamificado e homogeneizado das outras redes que cansam muito. Não preciso de muito esforço pra achar algo interessante pra ler aqui, diferente do Instagram onde tudo parece que virou vídeo de coach, de vender curso, ou ambos. Seria o problema das plataformas de boomer, onde tem menos gente jovem, espirituosa e sem nada a perder e mais gente burra velha preocupada em fechar as contas num mundo de trabalho precarizado e mal pago?4
Já tenho idade suficiente pra saber que não se deve olhar essas plataformas e seus modelos de negócio de forma ingênua. Porém, o prospecto da redução de tráfego em outras redes mais velhas e que já não estão muito bem das pernas me parece interessante. Especialmente quando viram brinquedo de fascista.
No caso do Substack, ainda não sei se há algum tipo de algoritmo por trás da plataforma. Acho pouco provável que ela esteja completamente zerada, mas ainda não chega perto do que é feito em outras redes, em que o seu conteúdo pode ter perdas severas de alcance dependendo de coisas como palavras utilizadas ou o que aparece no vídeo.
Outras redes tentaram ser o refúgio do tuiteiro que queria escapar do Elon Musk, mas o que me parece que tá vingando nesse sentido é o Substack, justamente por ser essa rede de blog remunerado que acabou caindo no gosto de pessoas que trabalham com texto.
Outras redes tem uma cartilha de como criar uma rede de sucesso - quantas postagens fazer por dia, com qual teor, com as palavras chaves, o tipo de imagem que tem que ter, etc. Aqui, com o perdão do trocadilho, ela ainda não foi escrita.
E nesse aspecto até que estou sendo mais feliz aqui, pois dá pra assinar umas coisas realmente boas.