Quando a gente ignora os n-centos pôsteres de filmes que utilizam Trajan, as produções audiovisuais tornam-se um caso de estudo interessante para a tipografia. Uma escolha sábia permite ao espectador entender o espírito de uma obra já pelo título, ou entender como alguns pôsteres destacam-se dos demais. Só que a relação do cinema com a tipografia não resume-se à direção de arte.

O roteiro de produções audiovisuais tem pequenas diferenças de formatação entre cada país e formato de produção (curta e longa metragem, série, novela etc.). No entanto, todos usam a mesma fonte: Courier, 12 pontos. A fonte, além de estar presente em quase todo dispositivo, reproduz a escrita feita nas máquinas de escrever, antes que os computadores fossem populares. Por fim, o roteiro escrito numa fonte monoespaçada faz com que cada página descreva, em média, um minuto de vídeo transcorrido.

Vários aplicativos feitos para escrever roteiros utilizam a Courier como fonte padrão, cabendo ao usuário apenas escrever. Há também uma versão chamada Courier Prime, disponível gratuitamente, que otimiza a Courier especificamente para roteiros.

A tipografia também tem regras e causos específicos para os pôsteres de filmes. Do cinema caseiro dos irmãos Lumière aos blockbusters atuais, a quantidade de pessoas envolvidas na produção de um filme cresceu vertiginosamente. Para assegurar que todos os principais participantes tenham seus créditos reconhecidos no pôster, os sindicatos de roteiristas e diretores dos EUA estabelecem que os nomes dos profissionais não podem ser menores que 15% da altura do título do filme. A solução para comportar tantos nomes junto com a arte do pôster, quase sempre, é utilizar fontes ultra-comprimidas, como a Univers 39.

Por fim, há também os tipos que aparecem na cenografia, como títulos em jornais, placas de lojas, faixas de algum evento, que geralmente aparecem escritas com fontes que ainda não tinham sido inventadas na época em que os personagens se situam. O Mark Simonson tem a seção Son of Typecasting em seu blog, dedicada a apontar essas falhas presentes em grandes, médios e pequenos filmes. É pedância gratuita? R: Sim. É divertida? R: Também. =D

Existem outros laços interessantes entre cinema e tipografia (letreiros de créditos, cinema-mudo etc), mas valem textos específicos mais pra frente. ;)

Recomendações:

• 🎧 Podcast: Entreletras #11, com a type designer portuguesa Joana Correia.
• 🎥 Vídeo: Bad typography has ruined more than just the Oscars, da Vox, sobre a confusão do Oscar de melhor filme em 2017 e outras situações comprometidas por más aplicações de tipografia.
• 🔗 Link: Why Do All Websites Look the Same?, um artigo sobre as limitações técnicas e o dia a dia de desenvolvedores e desigers, e como isso contribui para que os sites sejam excessivamente parecidos.
• 🇧🇷 Fonte brazuca: Capitolina, de Christopher Hammerschmidt e Marconi Lima.

Escrito em 96679.52.