Tipo Aquilo #17 — Pimentão Verde kg 2,98
Uma piada recorrente da minha vida é a de que, se tudo desse errado, eu tentaria vender minha arte na praia ser cartazista de supermercado. Antigamente, era só uma piada jocosa (desculpa sociedade); hoje em dia, não me faz largar o Glyphs e viver só de marcador e tinta, mas tornou-se algo que eu gosto de observar onde ainda está presente. Quase sempre tratado como um "primo pobre" do sign painting, o letreiramento de supermercado é uma linguagem tão incrível quanto pouco valorizada.

Pense que, quando um estudante de design ou publicidade começa a se interessar pelo ofício do desenho de letras, as referências mais comuns são os letreiros americanos, o fileteado portenho ou o lettering com giz e marcadores. São vertentes que encantam e têm grandes ilustradores em todo o mundo, mas que demandam muito tempo e paciência para que cada peça fique bem-feita. No varejo, a necessidade é uma peça bem-feita no menor tempo possível, para comunicar promoções temporárias, destacar produtos novos em estoque ou remarcar preços sensíveis à inflação (olá anos 80). Ainda é mais fácil e rápido resolver essa demanda com um letrista treinado e um ferramental próprio do que com computador e impressora.
Por causa da demanda a toque de caixa, o métier do letrista (ou cartazista) acabou desenvolvendo seu estilo particular de escrita rápida e legível, que por vezes lembra a do sign painting. No entanto, a escrita do cartazista toma proveito de pinceis de ponta larga para compor letras pesadas, raramente minúsculas, que abusam do contraste entre traços finos e grossos. Outra particularidade do ofício é o uso de poucas cores — geralmente vermelho, preto e amarelo — para ajudar a diferenciar informações e criar efeitos visuais simples e rápidos.

O uso das cores também tem um papel importante na hierarquização de conteúdo textual: embora os cartazes sejam grandes, as letras também precisam ser grandes para serem vistas à distância. Por isso, as cores vivas e as letras criadas com diferentes pinceis ajudam o leitor a diferenciar rapidamente o preço dos demais elementos. A oferta de poucas cores e tamanhos padronizados de pinceis cria uma uniformidade entre letristas de mercados diferentes, embora haja espaço para alguma diferenciação.
Embora os cartazistas não tenham formação em design gráfico ou tipografia, o trabalho exige deles um pensamento sistematizado de disposição de conteúdo, como um projeto gráfico simples. O ensino desse letreiramento é feito em cursos específicos, geralmente ofertados por associações de mercadistas, para formar nova mão-de-obra. Para onde não há cursos presenciais, há uma quantidade surpreendente de vídeos no YouTube para quem quiser conhecer mais e até praticar por conta própria.

Além de interessantes, esses cartazes ainda estarão presentes nos mercados por bastante tempo. Entre os cartazistas, existe um reconhecimento de pequenos detalhes que marcam estilo individual e o desprendimento de sempre explicar “cartazista? que profissão maluca é essa?”. A necessidade de fazer cartazes o tempo todo não impede que o cartazista, com o passar do tempo, consiga incorporar algum detalhe que traga um pouco de expressão individual; seja no acabamento das letras, ornamentos ou na disposição das informações. São detalhes pequenos, quase irreconhecíveis para o público comum, mas verdadeiras assinaturas entre seus companheiros de letras manuais.
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Recomendações:
- 🎧 Podcast: Coffee With a Sign Painter entrevistando Sam Macon, diretor do documentário “Sign Painters” e co-autor do livro homônimo.
- 🎥 Vídeo: BuzzFeed mostrando a produção de um cartaz, com depoimentos sobre a profissão de cartazista.
- 🔗 Link: Tipos e Textos, um artigo sobre como os cartazistas desenvolvem seu trabalho e pensam sobre as letras que produzem diariamente.
- 🇧🇷 Fonte brazuca: ZC Casual, de Flávia Zimbardi e Caetano Calomino.
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