Tipo Aquilo #14 – A credibilidade dos tipos
Quem sabe, quando eu inventar de perder mais vida social e começar um mestrado, uma ideia que tenho vontade de pesquisas é a associação entre tipografia e credibilidade. O que faz com que algumas fontes façam certas afirmações mais sérias e/ou dignas de crédito do que outras? Como a tipografia atua em contextos que as pessoas lêem algo e escolhem por acreditar ou negar o que está escrito?
Por ora, nem me preocupo tanto se isso tudo pode dar em alguma resposta concreta. Pense, por um segundo, num mundo em que muitas pessoas dão mais crédito a um meme escrito em Impact do que num texto bem diagramado e legível composto em Baskerville. Aliás, nem cito essa fonte à toa: em uma edição passada, eu mencionei uma pesquisa informal que elegeu os tipos de John Baskerville como a fonte que mais inspira credibilidade. Porém, você imagina a Baskerville como a primeira opção para um tabloide de supermercado ou um manual de aviação? Ou para um meme, por mais nobre que seja?

Ainda dentro do jornalismo, a escolha de fonte pode ser um fator importante para a credibilidade desejada. Em sua dissertação de mestrado, Melchiondo propôs uma análise da tipografia comparada entre sites norte-americanos de jornais famosos, sites de jornalismo independente e sites de “jornalismo” risos (hi InfoWars how you doin’?), de acordo com a inclinação partidária de cada um. Dentre seus achados, ele constatou disparidades nas escolhas de tipografia entre os diferentes posicionamentos de cada veículo.
Por exemplo, sites abertamente partidários, por exemplo, apresentam maior tendência a usar fontes sem serifa e condensada, ao contrário de sites politicamente moderados. Outro achado interessante é uma aparente preferência por fontes serifadas entre sites inclinados à esquerda (liberais), enquanto veículos mais conservadores apresentavam mais fontes sem serifa. Claro que esses dados, ditos assim fora de contexto, parecem só curiosidade boba — por isso, recomendo a leitura, enquanto tento descobrir se existe alguma pesquisa parecida aqui no Brasil.
Tipografia é algo que a gente apenas pensa que ninguém liga, mas no fundo, as pessoas se importam sim, e elas são capazes de apontar um veículo como mais ou menos confiável por causa das fontes. Pense que, se você fosse criar um site de notícias hoje, sua primeira ação seria posicionar-se comparado aos que já existem: seu site pode seguir um caminho mais fiel à história da imprensa, ou assumir uma postura crítica a tudo. Ele pode pautar-se pelo sensacionalismo, pela acurácia ou pela curadoria; pode ser personalista ou corporativista, e por aí vai. A tipografia precisa honrar todas essas decisões editoriais para que o site ganhe credibilidade em seu público de interesse.

Não à toa, o colunista Antônio Prata descreve como uma mera mudança de Arial para Times New Roman fez com que ele encarasse seus próprios escritos de outra forma. As pessoas comuns podem até se iludir achando que, quando podem escolher fontes, fazem-no por critérios técnicos e chavões como “fonte serifada é mais legível”; no fundo, as pessoas querem expressar personalidade, transmitir credibilidade e sentir-se pertinentes a seus grupos de interesse, tal qual a pirâmide de necessidades de Maslow (que, pro bem da verdade, Maslow nunca fez) preconiza. ;)
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Recomendações:
- 🎧 Podcast: Viviouvi #4 – Meme é arte?, com Aslan Cabral e Vivian Villanova numa conversa séria e cheia de fundamento sobre… memes.
- 🎥 Vídeo: TEDx – The subconscious effect of typography, em que Samantha Byrn explica sobre como a nossa percepção de produtos e mensagens muda de acordo com a tipografia utilizada.
- 🔗 Link: BuzzFeed; pra descontrair um pouco, um teste do BuzzFeed sobre qual fonte reflete a sua personalidade.
- 🇧🇷 Fonte brazuca: Lygia, de Flávia Zimbardi.
Escrito em 97257.56