Equivalências (x abraços = y piadas)
Quinta, 13 de agosto de 2020
Plano experimental de equivalências (x abraços = y piadas)
Proponho através desse plano, que analisemos equivalências hipotéticas, que experimentemos colocar valor naquilo que não pode ser medido. Venho, assim, refletir sobre o valor que atribuímos às coisas e os compromissos mentais que assumimos com eles.
A equivalência que trago à mesa hoje, é a seguinte: x abraços = y piadas. Colocando em outras palavras, busco entender quantos abraços valem por uma piada e vice-versa. Escolhi dois atos que me são muito tocantes e que geram felicidade e riso. O abraço por meio do contato e a piada por meio da narrativa.
Primeiro, é necessário estabelecermos alguns pontos sobre cada um:
- O abraço constitui na aproximação de dois corpos, seguido do enlaçamento do corpo um do outro com os braços. O que nos interessa aqui, é o abraço livre de formalidades, aquele que vai além de um cumprimento e que tem uma intenção carinhosa por trás. Esses abraços de afeto possuem alguns atributos que podem variar: força e sua oscilação ao longo do abraço, proximidade, duração, posição das mãos e corpo, vontade que dure mais do que ele realmente dura, entre outros.
- Já a piada que nos interessa aqui, é aquela que uma pessoa conta para outra. A piada consiste em estabelecer e comunicar uma narrativa, real ou ficcional, que gera riso na sua conclusão (e, por vezes, no seu decorrer). As piadas também possuem alguns atributos que variam entre si, são eles: duração, construção de expectativa, expressão corporal, entonação, temas, vontade de ouvir mais uma, entre outros.
Algo que os dois têm em comum é o fato de gerarem universos íntimos compartilhados, que podem variar em intensidade. O abraço, cria um espaço entre os corpos e entrelaça eles de maneira a gerar um ambiente particular de afeto. Já a piada, estabelece uma realidade particular, um universo criado naquele momento que o narrador e o ouvinte tem toda a sua atenção dedicada e sua realidade deslocada para aquela história que é contada.
Penso que, para buscarmos equivalências nesses dois atos podemos utilizar de alguns recursos. Um deles, que considero mais direto e menos sensível, é pegarmos a referência por hora do salário mínimo brasileiro e, a partir da duração da piada e do abraço, calcularmos o valor em reais. Outra proposta, que me parece mais sensível e subjetiva, é listarmos atributos em comum entre os atos (duração, uso do corpo, vontade de que dure mais...) definirmos uma pontuação para cada atributo, somar as pontuações de cada ato e dividirmos um pelo outro, o resultado indica a equivalência entre eles.
Não quero apresentar uma solução final aqui, mas quero deixar meios para que se possa refletir sobre o plano de equivalências. Consigo pensar em diversos problemas com os métodos propostos e não vou esmiuçá-los nesse texto. Contudo, um pensamento que me vem à cabeça é de que, essa tentativa de equivaler abraços e piadas, possa gerar um ciclo de repetições. Se observarmos que o abraço espera uma atividade similar dos envolvidos e a piada presume um participante ativo e outro passivo, podemos imaginar uma situação hipotética:
Duas pessoas recebem e dão um abraço ao mesmo tempo, mas sempre teremos oscilações de intensidade entre elas. A pessoa que colocou a menor intensidade, tenta compensar contando uma piada. Não sabendo medir a qualidade necessária para equivaler o abraço, acaba deixando a outra em débito, que propõe mais um abraço para compensar. O abraço acontece dessa vez com ainda menos intensidade por parte da primeira, quando ele acontece só por compromisso vai perdendo a força. Então, sentindo a necessidade de retribuir, conta outra piada, que também perde em intensidade e tenta compensar com mais um abraço. E assim, a situação se alonga com tentativas de chegarem a uma equivalência das entregas, resultando na completa perda de intensidade dos atos ou, quem sabe, no entendimento de que não vale a pena equivaler assuntos de ordem tão singular.
Mais alguns assuntos de ordem singular:
- Tempo
- Atenção
- Conversas que permeiam madrugadas
- Observação atenta do outro
- Frio na barriga
- Tombos e quedas
O que eu ando fazendo
lendo - Terminei de ler On the Road. Um belo livro, com um ritmo de vida real. Tudo acontece de repente e nada se conecta muito. Ele dá aquela vontade de largar tudo e sair pedindo carona sem destino certo...
ouvindo - A recomendação é o álbum Lóki?, do Arnaldo Baptista. Ele é genial em muitos aspectos, passa por rock, bossa nova e fala de coisas como chuchus belezas, tomates maravilhas e questiona o porquê não se fazem conjuntos habitacionais menores.
assistindo - O time lapse de um abacaxi crescendo.
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Por hoje é só! Em breve, retorno com mais…